“O paciente é o centro do cuidado. É para ele e para ele que o sistema de saúde funciona”, diz Dra. Aline Yuri Chibana, sócia da SAESP e vice-presidente da Fundação para Segurança do Paciente. A anestesiologista questiona o conceito histórico de que a medicina foi construída com o foco no desejo do médico. Sua área de trabalho traz justamente a segurança e o bem-estar do paciente em primeiro lugar. E mais, ela divulga conceitos e técnicas que aplica em seu dia a dia para os seus colegas, mostrando que o resultado é positivo tanto para o profissional quanto para o paciente.

De forma simplificada, o médico e o paciente têm o mesmo objetivo: a rápida recuperação e restabelecimento da saúde. Justamente por essa razão, “entendemos que um paciente empoderado e engajado é uma barreira de proteção poderosa contra alguns eventos adversos”, defende. Contudo, os desafios são muitos e mesmo o Brasil fazendo grandes avanços na última década, esse tema ainda é recente. O Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP) só foi criado em 2013, por exemplo. “Construir uma cultura de segurança forte leva tempo, mas estamos no processo”, diz Dra. Chibana.
Assim como o Brasil, países da Europa e os Estados Unidos enfrentam desafios similares. A comunidade médica que se dedica à segurança do paciente no Brasil tem tentado absorver ao máximo o que outros países têm experimentado, “mas ainda lidamos com o subfinanciamento e com uma cultura de segurança ainda imatura”, afirma.
Método, ferramentas e resultados
Aliando o Design Thinking e a análise de dados, a médica está conseguindo implementar melhorias significativas nos ambientes hospitalares. O Design Thinking é um método em que a abordagem busca a resolução de problemas de forma colaborativa. “Os seus pilares principais são a empatia, a colaboração e a experimentação. O sistema de saúde é complexo e dinâmico e exige habilidades de trabalho em equipe, coordenação do cuidado e colaboração”, explica. Já sobre a análise de dados, a médica é enfática: “melhorias sustentáveis só são possíveis com a análise de dados”.
O modelo antigo, em que o profissional é o detentor do conhecimento e dita regras que os pacientes têm que acatar, já não funciona mais. A Dra. Aline explica que somente por meio de dados é possível provar que a anestesia é eficaz. “No grupo em que trabalhava em 2014, notamos que dois processos poderiam ser melhorados: manejo de via aérea difícil e monitorização intraoperatória”, conta ela, que trabalhava com pacientes oncológicos submetidos a cirurgias complexas e usando poucos monitores invasivos. “Descobrimos que mais da metade das vias aéreas difíceis eram mal manejadas”, completa.
Para trabalhar na resolução do problema, a anestesiologista e a equipe implementaram uma série de melhorias, como a compra de novos dispositivos para manejo de vias aéreas, criação do carrinho de via aérea difícil e treinamento do grupo em fibroscopia. E o resultado chegou. “Após dois anos, a taxa de vias aéreas mal manejadas tinha caído para 12%. Em relação à monitorização, reformulamos nosso protocolo e orientamos o grupo a usar determinados monitores de acordo com o porte cirúrgico e a classificação do estado físico (ASA) do paciente. Fizemos um estudo do antes e depois da implementação do novo protocolo, que foi publicado. Reduzimos o delirium pós-operatório em 50% e diminuímos o tempo de internação hospitalar em quase um dia”, relata.
Vida pessoal, desafios e burnout
O trabalho da anestesiologista Dra. Aline Chibana envolve empatia, cuidado, análise dos procedimentos atuais e proposição de novos processos para que não só os seus pacientes, mas todos os que passam por algum procedimento cirúrgico possam ser tratados com qualidade e segurança. Em 2018, entretanto, ela foi diagnosticada com burnout e depressão, condições de saúde que ainda são permeadas de preconceitos e, depois de muita reflexão, decidiu falar abertamente sobre o tema. “Senti que eu precisava falar para mostrar que isso acontece e que precisamos procurar ajuda. Quando você se mostra vulnerável, você dá a chance ao outro de ser vulnerável também”, desabafa.
Ainda se acredita no mito do “médico super-herói”, que abdica de sua vida pessoal para salvar a vida do outro, aquele que faz horas de plantões intermináveis e que não tem tempo nem para a família. Mas, a realidade é bem diferente. “Não é à toa que vemos tantos colegas doentes; e se você procura uma outra forma de viver, com vida fora do trabalho, você que não ‘aguenta o tranco’. Na verdade, quem aguenta?”, questiona. “Estamos discutindo estas questões mais abertamente nos últimos anos, inclusive nos congressos. Precisamos discutir muito mais. Precisamos aprender a pendurar nossos jalecos de vez em quando para encontrar a vida fora do trabalho”, finaliza.
Referência Bibliográfica:
Lima MF, Mondadori LA, Chibana AY, et. al. Outcome impact of hemodynamic and depth of anesthesia monitoring during major cancer surgery: a before-after study. J Clin Monit Comput. 2019:33(3):365-371. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/30074124/
DOI: 10.1007/s10877-018-0190-8.
Fonte:
JPanegassi Produções Editoriais